Ana Lucia Santos Coelho e Ygor Klain Belchior


A EXTREMA-DIREITA BRASILEIRA E SUA VISÃO (IDEOLÓGICA) DA CAVALARIA MEDIEVAL



A ascensão global da extrema-direita no mundo contemporâneo resultou nas eleições de governantes como Donald Trump, Boris Johnson e Jair Bolsonaro. Suas vitórias foram sustentadas por manipulações ideológicas do passado trilhadas, sobretudo, a partir de interpretações negacionistas e enviesadas de episódios traumáticos da História. Por exemplo, no Brasil, não é incomum encontrarmos pessoas que negam a existência da Ditadura e da escravidão dos africanos.

Segundo Rüsen [2007, p. 57], as manipulações do passado interferem diretamente na construção das Consciências Históricas, que correspondem “a soma das operações mentais com as quais os homens interpretam sua experiência [...] temporal [...], de forma tal que possam orientar, intencionalmente, sua vida prática no tempo”. Ou seja, se lermos o passado por meio do negacionismo da Ditadura, podemos afirmar que não há, no Brasil hoje, perseguição às ideologias de esquerda. De igual modo, se lermos o passado por meio do negacionismo da escravidão dos africanos, podemos afirmar que não há racismo no país.

Não esqueçamos que os negacionismos estão ligados às manipulações ideológicas do passado. A nosso ver, elas são muito mais nocivas à Consciência Histórica, pois, por serem divulgadas como estudos sérios, convencem um imenso público. Por exemplo, na eleição de Jair Bolsonaro à Presidência da República, em 2018, tivemos manipulações ligadas ao papel das Ordens Militares no Medievo. A partir delas, seus apoiadores adquiriram uma identidade política, cujo mote era defender o Ocidente, entendido como um mundo de brancos, cristãos e defensores da monarquia. Observemos uma ilustração:



Fonte: https://www.facebook.com
[Optamos por preservar a identidade do autor].

Nas imagens, notamos que a identidade política bolsonarista estava calcada na admiração do passado medieval. Tal admiração tomou uma dimensão tão grande que, alguns órgãos midiáticos, decidiram entrevistar medievalistas a fim de compreenderem a conexão estabelecida entre a Idade Média e Jair Bolsonaro/Extrema-Direita. Nesse sentido, o blog Agência Pública divulgou, em abril de 2019, uma reportagem intitulada Deus vult: uma velha expressão na boca da extrema direita, na qual Paulo Pachá, Professor de História Medieval da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) comentava sobre o assunto. Para ele, a Extrema-Direita manipulou ideologicamente o passado no intuito de criar uma sociedade idealizada – ficcional – que era, em sua maioria, branca, cristã e patriarcal. Por conseguinte, essa sociedade trazia discursos preconceituosos de como racismo, homofobia, islamofobia e machismo. Vejamos as palavras do entrevistado:

“No Brasil, essa referência cruzadista tem sido utilizada por bolsonaristas na esteira da direita alternativa norte-americana, também conhecida como alt-right. ‘Está decretada a nova cruzada. Deus vult!’, comemorou no Twitter o analista político Filipe Garcia Martins quando da vitória de Bolsonaro. Aluno de Olavo de Carvalho e atual assessor para assuntos internacionais da Presidência da República, Martins escreveu durante a posse: ‘A nova era chegou. É tudo nosso! Deus vult!’. Além dele, outros apoiadores bolsonaristas têm feito uso da expressão. ‘Precisamos de um São Bernardo de Claraval [abade encarregado pelo papa de pregar a Segunda Cruzada] para animar novas Cruzadas. CHEGA’, escreveu o tuiteiro e youtuber Bernardo P. Küster, após ataques de terroristas muçulmanos contra cristãos no Sri Lanka em 21 de abril deste ano” [Oliveira; Rudnitzki; 2019].

Por trás dessas visões aristocráticas e nacionalistas, escondiam-se pressupostos problemáticos da pesquisa científica. A partir daqui, objetivamos apontar os equívocos que a extrema-direita brasileira promoveu em sua manipulação do passado. Para tanto, dissertaremos sobre as Ordens Militares na Europa medieval, entre os séculos VIII ao XIII. Antes, porém, discutiremos os conceitos de Feudalismo e Cristianismo.

Feudalismo
O conceito de Feudalismo é a origem maior dos equívocos. Há um desconhecimento sobre o fato de que a Idade Média e o Feudalismo são construções históricas, fabricadas posteriormente por pessoas que tentaram impor suas ideologias aos eventos.

Abels [2009] explica que o conceito de Feudalismo é um “tipo ideal” surgido no século XVII e consagrado no XIX, com diversos significados, desde uma qualidade, a “feudalidade”, até a sua consolidação como um modo de produção entre o antigo e o moderno, com Karl Marx.

Strayer e Coulborn [1956] concordam com Abels [2009]. Os primeiros apontam o Feudalismo como uma abstração evocada para descrever práticas de sociedades posteriores ao medievo, a exemplo da Ordem do Santo Sepulcro no Brasil, existente no Rio de Janeiro. Por sua vez, o segundo comprova, através da análise dos vocábulos “feudo”, “benefício” e “vassalo”, a inexistência de uma definição legal para o conceito de Feudalismo até o século XII.

Ao seu turno, Bennett e Hollister [2006] consideram que, se o Feudalismo existiu, foi estritamente um fenômeno de fragmentação territorial ocorrido na França. Ele nunca se desenrolou como um sistema universal ou simétrico, nem mesmo onde surgiu, no norte da França, pois coexistiu com uma variedade de formas de posse da terra, a exemplo dos alódios (propriedades de camponeses livres). Ademais, o conceito de Feudalismo não possuía relação com cavalheirismo e nunca foi uma instituição militar.

Os historiadores contemporâneos preferem utilizar o conceito de Dominação Senhorial em detrimento de Feudalismo. Eles defendem que a dominação senhorial permite entender o poder dos senhores para além do feudo, centrando-se no grande domínio. Para Cândido da Silva [2019], o maior problema do conceito de Feudalismo é que ele privilegia as relações interpessoais, associando-se ao conceito de Vassalagem, conjunto de relações de uma pequena parcela aristocrática nascida da concessão de um “feudo”. É por isso que o termo Senhorio é mais adequado, pois abrange, de modo amplo, tanto as relações entre a aristocracia fundiária e os camponeses – livres ou não –, quanto às relações dentro da própria aristocracia. Além disso, Senhorio possibilita a compreensão do fato de que a dominação aristocrática ocorreu não apenas sob as terras, mas também sob os homens. Segundo o autor, tal sistema atingiu o seu apogeu entre os séculos XI e XIII, permitindo o enraizamento da nobreza e a ascensão do grupo mais rico de camponeses: os Cavaleiros.

Sobreira [2015] complementa o raciocínio de Cândido da Silva, sustentando que o grande domínio surgiu com as primeiras menções às corveias campesinas, datadas do século VI. Contudo, o autor defende que as práticas das corveias só se desenvolveram de maneira sistemática a partir do século VIII, haja vista que a sua existência é atestada por polípticos, fontes redigidas nos monastérios, entre os séculos IX e X. O políptico mais famoso contém o Breviarium de Gagny, documento que arrola a descrição das possessões da abadia local. Nele, temos a informação da existência de inúmeras formas de se caracterizar a posse da terra, como o manso dominal, manso dependente, manso independente, manso servil e a floresta, além de diversas formas de pagamento das obrigações senhoriais: em soldos de prata; vinho; sementes; trigos; carretagens; galinhas; ovos; telhas; entre outros.

Mas, se o Feudalismo não existiu, como explicamos o Encastelamento? De acordo com Johanek [1999], a construção dos castelos foi um fenômeno onde os nobres e os eclesiásticos tentaram intensificar o seu controle sobre os mercados que não eram necessariamente urbanos. Assim, não existiu uma desfragmentação das terras, na qual os senhores feudais recrutavam os cavaleiros e os entocavam em fortalezas para possíveis guerras. O que existiu foi uma divisão comercial das posses entre eclesiásticos e nobres, cujo impacto foi o crescimento das cidades, do comércio e da produção agrícola.

Cristianismo
Chevitarese [2006] argumenta que a gênese do cristianismo não teve nada de excepcional. Classificado como superstitio, e não como religio licita por Tácito e Dião Cássio, o culto cristão era só mais um dentre vários existentes na Antiguidade politeísta.

As primeiras comunidades cristãs floresceram em Roma, segundo Silva [2006], durante as décadas de 50 e 60 do século I d.C. Reunidas em pequenos grupos fora dos limites citadinos, não causaram boa impressão em seus primeiros anos. Inclusive, elas chegaram a ser objetos de lendas urbanas: nutriam ódio por todo o gênero humano, sacrificavam crianças em seus ritos e praticavam o canibalismo. No final do século III d.C., começaram as perseguições sob os governos de Trajano e Diocleciano, governantes que queriam restaurar os costumes do mos maiorum. A situação só mudou no século IV, com o governo de Constantino, o qual teve a audácia de aliar uma ideologia religiosa a um projeto de poder. Ele reuniu o primeiro Concílio ecumênico da história da nova religião, marcando o nascimento daquilo que chamaremos de Igreja Medieval, comunidade de fiéis organizados em torno da autoridade dos bispos, sobretudo os de Roma. A partir de Constantino, a aliança entre o poder temporal e a religião cristã fortaleceu a Igreja Católica.

Tal conversão, explica Segalen [2012], alterou a instituição do casamento e algumas normas sociais em Roma. A nova religião proibia que viúvas e divorciados se casassem novamente, o que limitou as descendências. Somado a isso, a pregação do abandono dos bens materiais em troca da salvação, tornou a Igreja a grande herdeira dos sem herdeiros. No final do século VII, estima-se que um terço das terras aráveis da França pertencia à Igreja. E mais: Cândido da Silva [2019] afirma que a maioria dos bispos católicos gauleses do final do século VII era originária de famílias da aristocracia imperial romana, desempenhando um papel preponderante na administração das civitates de procedência romana.

Podemos dizer, então, que entre os séculos VIII a IX, a Igreja não só era detentora de terras como também os seus líderes – os bispos – exerciam dominação senhorial, comandando juridicamente diversos territórios e explorando a mão de obra camponesa, através da cobrança do dízimo nas vilas e nas cidades e da cobrança das taxas do comércio.

A identificação dos habitantes da Europa com o cristianismo prosseguiu com as dinastias francas Merovíngia e Carolíngia, alega Cândido da Silva [2008]. Carlos Magno, por exemplo, foi aclamado pelo papa como Imperador do Sacro-Império Romano, expandindo a fé e a cultura cristãs por toda a Europa. Ele também ajudou a consolidar a ideia de que o soberano era o responsável, perante Deus, pela manutenção da paz e da justiça na terra.

Quando o Império Carolíngio desapareceu, no final do século IX, os bispos de Roma eram os únicos a poderem reivindicar um poder universal. Isso fez com que os efeitos da dominação senhorial fossem sentidos pela Igreja: muitos cargos de bispos e bens da Igreja passaram a ser transmitidos como herança. Ademais, tornou-se comum a venda de cargos eclesiásticos, prática conhecida como “simonia”, e a obediência política dos senhores à Igreja por meios dos juramentos de fidelidade. Portanto, a Igreja do período feudal, estava mais preocupada com a lógica da dominação senhorial do que com a pregação da palavra divina e com a defesa dos princípios cristãos.  

A Cavalaria
Comentados os conceitos de Feudalismo e Cristianismo, falemos sobre o conceito de Cavalaria. A primeira observação concerne às leituras que a consideram como um resquício da herança bárbara, um resquício, porém, cristianizado e civilizado pela Igreja. Os pesquisadores preferem dizer que ao invés de ter existido um processo de cristianização dos bárbaros houve uma militarização do cristianismo.

Em primeiro lugar porque não existiram bárbaros. Segundo Dumézil [2016], os grupos étnicos classificados como bárbaros já habitavam o Império Romano antes mesmo de sua dissolução, a exemplo dos Francos. Avaliando os artefatos arqueológicos, em especial, os túmulos, o autor atestou que as práticas consideradas “bárbaras”, como a diferenciação social através do exercício militar, são posteriores a entrada desses povos nos limites romanos e, como tal, devem ser entendidas como tentativas de reivindicar uma parcela de poder no Império em crise. Ademais, os reinos mantiveram e adaptaram a administração romana, o latim permaneceu a língua oficial e até o calendário era o mesmo dos romanos. 
Em segundo lugar porque o termo “Cruzadas” é recente e anacrônico. De acordo com Franco Júnior [1991], ele foi cunhado no século XIX para descrever práticas ocorridas na segunda metade do século XIII, sendo as verdadeiras “cruzadas” datadas no século XI. E mais: os membros das ordens de cavaleiros se consideravam como “soldados de cristo” (milites Christi) e não como cruzados, bem como buscavam o perdão para os seus pecados e não a guerra contra o infiel. Existe ainda outro problema: o do embate religioso entre cristãos e muçulmanos. Para Maalouf [1988], aos olhos dos medievais orientais, as “cruzadas” não foram vistas como uma espécie de jihad, pois permaneceram durante muito tempo como conflitos defensivos contra os francos, não os cristãos.

Visto isso, falaremos sobre as origens da cavalaria. Barthélemy [2007] defende que o seu surgimento ocorreu no período da “mutação feudal” (século IX), isto é, alguns anos depois do fim do Império Carolíngio. Sustenta também que não houve uma cristianização da cavalaria, pois, os milites já eram cristãos. Porém, o cristianismo criou uma nova forma de se fazer guerras, pois promoveu o encontro entre as práticas monásticas e as guerreiras. Portanto, o autor acredita no surgimento de um novo tipo de cristianismo, oriundo da religiosidade militar. Em outras palavras, houve, na verdade, a militarização do vocabulário cristão, uma prática que, se não for bem estudada, pode gerar leituras equivocada do papel das ordens.

Por fim, resta observar como próprios cavaleiros se entendiam. Carraz [2017] estuda as pinturas das capelas dos Templários e dos Hospitalários na França. Para ele, na prática templária havia a preferência por uma iconografia martirológica relacionada à vocação das ordens, isto é, os Templários não se viam como assassinos fanáticos, mas como mártires prontos a se sacrificarem pelos peregrinos.

Considerações Finais
Nesse pequeno texto, vimos que as ordens militares foram utilizadas pelos clérigos para a inserção do cristianismo dentro de um comportamento bélico. Ou seja, as ordens militares já eram cristãs e bélicas. Mas, os clérigos queriam usá-las para promoverem o comportamento cristão bélico, de luta contra o infiel. Para isso, a Igreja criou uma imagem quixotesca dos cavaleiros, como se o único papel deles na sociedade fosse lutar contra os infiéis. Todavia, os cavaleiros eram homens do seu tempo, que participavam da lógica social e que se viam mais como protetores dos peregrinos. Portanto, cabe concluir dizendo que a leitura bolsonarista do passado é completamente equivocada, estando mais interessada em levantar uma bandeira política do que em compreender os eventos históricos.

Referências biográficas:
Ana Lucia Santos Coelho é doutoranda em História Antiga na Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP). Atualmente, trabalha como professora de Metodologia Científica e de Estágio Supervisionado em História na Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS). E-mail: ana.scoelho@hotmail.com
Ygor Klain Belchior é doutor em História Antiga pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, é professor de História Antiga, História Medieval e História da Arte da Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG – Campanha). Email: ygorklain@gmail.com

Referências:
ABELS, R. The historiography of a construct: “Feudalism” and the medieval historian. History Compass, v. 7, p. 1008-1031, 2009.
BARTHÉLEMY, D. La Chevalerie: de la Germanie antique à la France du XIIe siècle. Paris: Fayard, 2007.
BENNETT, J. M.; HOLLISTER C. W. Medieval Europe: a Short History. Boston: McGraw-Hill, 2006.
CÂNDIDO DA SILVA, M. A Realeza Cristã na Alta Idade Média: Os fundamentos da autoridade pública no período merovíngio [séculos V-VIII]. 1ª ed. São Paulo: Alameda Editorial, 2008.
_______. História Medieval. 1ª ed. São Paulo: Editora Contexto, 2019.
CARRAZ, D. O lugar da imagem pictórica e da espiritualidade junto aos Templários e Hospitalários: estado da questão no espaço francês. Horizonte, Belo Horizonte, v. 15, n. 48, p. 1191-1219, p. 1191-1219, 2017.
CHEVITARESE, A. L. Cristianismo e Império Romano. In: SILVA, G. V. da S.; MENDES, N. M. [Orgs.]. Repensando o Império Romano: Perspectiva Socioeconômica, Política e Cultural. Vitória: EDUFES, 2006. p. 161-173.
COULBORN, R.; STRAYER, R. The Idea of Feudalism. In: COULBORN, R. [Ed.]. Feudalism in History. Princeton: Princeton University Press, 1965. p. 3-11.
DUMÉZIL, B. Les Barbares. Paris: Presses Universitaires France, 2016.
FRANCO JÚNIOR, H. As Cruzadas. São Paulo: Editora Brasiliense, 1991.
JOHANEK, P. Merchants, markets and towns. In: REUTER, T. [Ed.]. The new Cambridge Medieval History. v. 3. Cambridge: Cambridge University Press, 1999. p. 64-94.
MAALOUF, A. As Cruzadas vistas pelos Árabes. São Paulo: Brasiliense, 1988.
OLIVEIRA, R.; RUDNITZKI, E. Deus vult: uma velha expressão na boca da extrema direita. Agência Pública. Disponível em:
<https://apublica.org/2019/04/deus-vult-uma-velha-expressao-na-boca-da-extrema-direita/>. Acesso em 23 mar. 2020. 
REYNOLDS, S. Fiefs and Vassals: the Medieval Evidence Reinterpreted. Oxford: Oxford University Press, 1994.
RIBEIRO, D. V. A Cristandade do Ocidente Medieval. São Paulo: Atual, 1998.
RÜSEN, J. Teoria da história: fundamentos da Ciência Histórica. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2001.
SEGALEN, M. Introdução. In: GOODY, J. L’Évolution de la famille et du mariage em Europe. Paris: Armand Colin, 2012.
SILVA, G. V. da. A relação Estado/Igreja no Império Romano: Séculos III e IV. In: ______.; MENDES, N. M. [Orgs.]. Repensando o Império Romano: Perspectiva Socioeconômica, Política e Cultural. Vitória: EDUFES, 2006. p. 241-266.
SOBREIRA, V. O modelo do grande domínio: os polípticos de Saint-Germain-des-Prés e de Saint-Bertin. São Paulo: Intermeios, 2015.



65 comentários:

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  2. Vocês percebem também um certo tipo de "romantização" da ordem militar? Como se vivêssemos em um loop infinito de Dom Quixote, onde os militares tentam proteger a moral e os bons costumes, saindo totalmente de seus reais atributos.
    Willames Nunes da Silva

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    2. Sim, e há estudos sobre isso. Em A Cavalaria: da Germânia antiga à França do século XII, Dominique Barthélemy chama esse fenômeno de leitura quixotesca.

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  3. Como é abordado esse tema de cavalaria nos livros didáticos?
    Janaína Maria Baruffi

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    1. A Cavalaria é pouco explorada nos livros didáticos. Muitas vezes, é citada apenas como nobres guerreiros do sistema feudal.

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  4. Olá! Primeiramente queria parabenizar os autores e seu texto, pois ele apesar de sucinto é bem informativo, com uma ótima análise do presente momento brasileiro. Por fim, gostaria da opinião dos autores sobre a forma mais apropriada de lidar com aqueles mergulhados nas fantasias pseudomedievais que isistem em uma romantização do tema relatada?

    GIOVANNA MAYARA DE SOUZA LIMA.

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    1. A melhor maneira é fazê-los entender que, antes de defenderem algo com unhas e dentes, é preciso estudar o que é.

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  5. Caros autores, bom dia. Não entendi bem. O termo feudalismo na sua opinião não é correto? Melhor usar encastelamento?
    Ass. Nathany A W Belmaia

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    1. O termo feudalismo hoje não é mais usado. Hoje prefere-se Domínio Senhorial. O fenômeno de multiplicação dos castelos, que as pessoas chamavam de anarquia feudal, é entendido como encastelamento

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  6. A utilização do discurso da extrema-direita sobre o “porte/uso de armas” somente para a proteção pessoal e de sua família dentro da sua propriedade, aliado ao discurso cristão, pode ser relacionado com a equivocada interpretação de que os cavaleiros eram meros “defensores da igreja”?
    Wesley Bruno Andretta

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    1. Sim. E é uma apropriação de um discurso, que vem lá de Santo Agostinho, de que contra o infiel matar é uma ação justa.

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  7. Elvis Rezende Messias18 de maio de 2020 às 16:40

    Muito boa a proposta reflexiva do texto. Parabéns e obrigado aos autores.
    Faço um comentário e, em seguida, uma questão:

    A imagem do cristianismo e do catolicismo propulsada por Bolsonaro, Olavo de Carvalho, Bernardo Kurster e afins, não corresponde àquilo que identifica o cristianismo católico nos documentos oficiais do Magistério eclesiástico. A postura pretensiosamente “anticomunista” desse grupo pretende militarizar a fé católica (imaginário que ainda é típico na cabeça de muitos católicos, que ainda utilizam termos como “milícia celeste”, “guerreiros da fé”, “Cristo é nosso general”, “Deus dos exércitos” etc.) realmente em nome de interesses políticos e grupais restritos. Assim, tal "militarização anticomunista" (e, agora, também "anti-esquerdista" em sentido ainda mais genérico) da fé termina por promover aquilo que pretendem atacar: totalitarismo, incompreensão do conceito de pessoa, afronta à liberdade pessoal, exclusão, miséria, materialismo, atmosfera pragmática geradora de repulsa à fé, instrumentalização política da fé, idolatria a torturadores, nacionalismo desumano e luta de classes maniqueísta... João Paulo II, em um documento chamado “Centesimus annus” (1991, n. 14), e também no documento chamado “Laborem exercens” (1981, n. 11-15), disse claramente que a conflitualidade é um motor histórico, mas que ela adquire traços profundamente desumanos e desumanizadores quando o outro é visto meramente como um completo inimigo a ser destruído, desconsiderado os aspectos sociais das diferenças e ofuscando a humanidade presente no rosto do “adversário”, assumindo traços de violência e ódio que deixam de lado uma luta honesta por justiça transformando-se em verdadeiro fratricídio... Ou seja, tudo aquilo de que os bolsonaristas acusam no que entendem "comunismo" e pretendem combatê-lo é exatamente aquilo que eles mesmos promovem, fazendo prevalecer o uso da força em lugar da razão e do direito. Parto à questão:

    Em última instância, não seria o “cristianismo bélico” (pseudocristianismo) da extrema-direita, mais do que uma leitura equivocada de eventos do Medievo, uma idealização de fenômenos reacionários do Renascimento e da Modernidade, bem como uma nova forma de aplicabilidade do imperialismo e militarismo típicos dos ventos do século XIX (doutrina da “guerra total”)? Aliás, em que medida, também, estes fenômenos se relacionam?

    Elvis Rezende Messias.

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    1. Olá, companheiro Elvis. Sua pergunta é excelente. Sim, a imagem do cristianismo e do catolicismo propulsada por Bolsonaro e afins não identifica o cristianismo católico nos documentos oficiais do Magistério eclesiástico. Ainda bem! Cristão é diferente de fascista. A leitura, no caso, é ideológica no sentido de que ele observam na história práticas fascistas em seus heróis, a exemplo de um certo patriotismo cavaleiresco em uma época em que não existem nações. A questão é começarmos a identificar isso como manipulações ideológicas e combatê-las com o conhecimento, pois eles deturpam tudo.

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    2. Elvis Rezende Messias19 de maio de 2020 às 21:03

      Maravilha! Obrigado pela partilha, Ygor e Ana Lúcia!!!
      Grande trabalho pela frente, sobretudo em tempos em que o polarismo e o negacionismo impede o diálogo. Grande abraço.

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  8. Boa Tarde!
    Minha dúvida em relação ao texto refere-se a questão do feudalismo e Dominação Senhorial. O que o conceito de Dominação Senhorial tem a dizer sobre a conceito de Modo de Produção?

    Luan Felipe Silva Casarin

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    1. Modo de produção feudal é colocar o feudo em primeiro plano. Sendo assim, é um olhar econômico. Dominação senhorial tira o feudo do primeiro plano e foca na dominação (poder por leis e nascimento) que vai além da terra, mas também a homens. Nesse sentido, abrange os bispos, pois eram detentores de terras e detinham poderes sobre as pessoas sem serem "senhores feudais" ou estarem no "modo de produção".

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  9. Os autores ao observar o cenário politico atual do Brasil, se sentem na era medieval? Cito como exemplo o uso da religião para interferir na gestão administrativa. E como podemos lidar com os revisionismos negacionistas deturpados da extrema-direita?

    Maria Amanda Nunes dos Santos.

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    1. Não podemos confundir extremismo religioso com Idade Média. Hoje, por exemplo, não temos um São Tomás de Aquino nas Igrejas Evangélicas.

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  10. Boa Noite!!
    Minha duvida é em relação á idade média, se além das questões politicas, enxergamos ainda na sociedade não só brasileira, mas também na America Latina algum resquicio da idade média no nossos dias?

    Edilson Bernardo de Oliveira

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    1. A Idade Média é parte da criação do Ocidente. Busque ler os livros do Le Goff ou um que chama Idade Média nascimento do Ocidente. Vale a pena. Somente lembrando que aqui nunca houve Idade Média.

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  11. Muito interessante seu artigo, desse modo como você ver essa negação do passado histórico francês para essa roupagem nos protestos da extrema direita, seria um caso de ligarem a uma luta religiosa/política com um viés ideológico de dominação e não um caso de ressignificação de um histórico político medieval? Sabemos que o cinema e a literatura fantasiaram em demasia sobre o mundo europeu medieval a ponto da sociedade atual ter a consciência errôneas de todas os povos daquele tempo. A ponto de confundir as diversas tipificações acerca dos conceitos como: feudalismo, sociedade senhorial, e ordem cavaleiresca, cruzados, etc. Desse modo a extrema direita utiliza desse conceitos que foram fantasiados de maneira fantasiosa de uma construção do passado imaginário como uma época perfeita, por meio da tradição inventada costurando uma memória, inventando tradições, encontrando assim uma origem que religa os homens do presente a um passado, e que atribuem um sentido a existências cada vez mais sem significado.

    luanna Klíscia de Amorim Mendes

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    1. Alguém tem avisar a eles que os Templários não existem mais

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  13. Queridos autores,
    primeiramente gostaria de parabenizá-los pela escrita do artigo.
    Ficou claro na escrita do trabalho que há uma manipulação ideológica do passado histórico medieval para dar base de justificação às ideias e atitudes de grupos políticos no Brasil contemporâneo.
    No entanto, gostaria de saber se observam também essa manipulação histórica ligada à Hierarquia eclesiástica no Brasil atual ou a um setor dele. Se sim, essa manipulação seria uma desvio à visão cristã ou seria considerada como acertiva e majoritária dentro do corpo eclesiástico?

    Kayo Eduardo M. de Almeida

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    1. Não acredito que isso parta do movimento eclesiástico católico. É muito mais um leitura fascista da religião Cristã.

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  14. Boa tarde, primeiramente parabéns pelo texto. Muito esclarecedor. Minha dúvida é como abordar essas novas tendências historiográficas no ensino de história na educação básica, visto que o termo feudalismo está enraizado na cultura escolar? Raimunda Conceição Sodré.

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    1. Olá,

      Sim, tem como abordar na educação pública. Há muitos artigos na internet sobre essa temática feudalismo e ensino de história.

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  15. Olá,

    Sim, tem como abordar na educação pública. Há muitos artigos na internet sobre essa temática feudalismo e ensino de história.

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  17. Primeiramente parabenizo os autores. E a pergunta que gostaria de fazer é que diante de um cenário onde "web personalidades" estão tendo uma grande influência numa sociedade digitalizada, como fica a situação do historiador como produtor de conhecimento, diante ataques de digital influenciadores negacionistas/revisionistas?

    JOÃO VICTOR ROCHA DE LIMA

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    1. É começarmos a ocupar essas mídias. Não podemos achar que existem formas nobres de divulgar conhecimento e formas menos nobres. A educação tem que ser fora da sala de aula também.

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  18. Olá, caríssimos

    Parabéns pelo texto com a temática atual...

    Minha dúvida é a seguinte: É possível afirmar que a utilização de termos, expressões e ideias "ressignificadas" do medievo na atualidade também se configuram como colocações anacrônicas? Se sim, como desconstruir estes discursos políticos-ideológicos em especial nas salas de Ensino Medio?

    At.te

    José Carlos da Silva Ferreira

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    1. Creio que começar a partir do que os alunos conhecem. Mostrar que sempre existe algo que esperamos que seja a Idade Média, com castelos, dragões e cavaleiros. Isso é uma coisa que aparece, por exemplo, em filmes que imitam o medieval, como game of thrones. Essa imaginação diz respeito a um curto período da Idade Média, isto é, o feudalismo. E nem tudo na Idade Média é feudalismo.

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  19. Prezados, muito bom texto, como coloquei noutra pergunta.

    Para além da pergunta anterior, gostaria de saber como é possível utilizar "memes" que utilizam da temática medieval fazendo as devidas ressalvas e problematizações, uma vez que a maioria dos "memes medievais" também obedecem a um discurso ideológico?

    At.te

    JOSÉ CARLOS DA SILVA FERREIRA

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    1. https://paginacinco.blogosfera.uol.com.br/2017/10/25/para-reagir-a-lunaticos-e-fascistas-quadrinista-cria-serie-brasil-medieval/

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  20. Ótimo trabalho. Me sinto satisfeito com os apontamentos teóricos feitos por ambos comunicadores. Gostaria assim, de tecer uma problemática e em seguida um questionamento.

    Na configuração política e ideológica atual em que o Brasil se encontra, muitos pseudohistoriadores acreditam estar produzindo uma "história" revisionista, de acontecimentos estudados afundo, e insofismavelmente estabelecidos, como é o caso, citado no início do trabalho, o Golpe Militar de 64 (e não a "Revolução Militar de 64") e a escravidão africana. O que na realidade, essas estórias distorcidas e controversas, afirmam um tipo de conto negacionista do conhecimento histórico. Nesse caso, os indícios dessa "atualização medieval" é latente no campo político a começar pelo, "Brasil acima de tudo" ("Deutschland uber alles"- "Alemanha acima de tudo", trecho da canção nacionalista alemã que ganhou força nos anos 1930 com o movimento nazista); movimentos políticos liberais como o MBL, em que o seu expoente máximo, Kim Katagniri acredita que a civilização ocidental é o espelho de uma sociedade ideal. Além de pseudohistoriadores youtubers, como o canal Brasil Paralelo, em especial, á uma série produzida por estes, "Brasil a última cruzada", que retrata de forma bem generalizada e controversa as heranças ocidentais que o período "medieval" incorporou a construção da identidade brasileira, glorificados por elementos audio-visuais pomposos e de encherem os olhos dos inscritos passivos de conhecimento histórico. Contudo, todos essas perspectivas, me parecem, buscar através do negacionismo e da fantasia, idealizar uma "Idade Média" que busque contribuir para afirmar a identidade brasileira através dos nossos "antepassados" europeus (uma espécie de Brasilcentrismo), além de um cristianismo conservador e patriarca.

    Nessa lógica, gostaria de saber, como os professores historiadores devem combater esses tipos de discussões estabelecidas por pessoas que não são historiadores (Jornalistas,pensadores, comentadores) nas plataformas de Streaming e em sites de "estudo",que interferem assim, na tentativa de desconstrução de uma "Idade Média".

    Ítalo Bezerra Oliveira.

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    1. Creio que o caminho é começar a fazer o que estamos fazendo: escrever, publicar e mostrar que há interpretações erradas. De outra forma, fica a nossa obrigação em aparecer em lives e ocupar um espaço que muitas vezes esquecemos.

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  21. A igreja hoje tem um grande papel em alavancar esse pensamento, nos cidadãos, principalmente os bolsonaristas cristãos que se agarram a esse discurso de Ultra conservador, protetor das familias, entre outros discursos homofóbicos e assim por diante... poderia eu fazer uma analogia aos bolsonaristas como o novo "soldado de cristo"?, pois eu como católico, ja vi Padre levantar bandeira, "que ser a favor do bolsonaro é questão de honra, pois ele defendia valores conservadores em quanto a esquerda prega o contrário" ou será um equívoco meu ?

    CLAUDIO ALMEIDA DE OLIVEIRA JUNIOR

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    1. Grande parte dos religiosos se esqueceu do cristianismo para defender valores conservadores.

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  22. Parabém pelo texto, é uma tema muito pertinente para os nossos dias. Como poderíamos abordar esse tipo de temática em sala de aula no ensino fundamental? Visto que os alunos e alunas são inundados por páginas do facebook e do youtube com essas visões equivocadas.
    Desde já agradeço a atenção,
    Atencisamente,
    Avelino Gambim Júnior

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    1. Devemos começar a ocupar esses espaços. Veja bem, grande parte dos academicistas adoram escrever textos corrigindo os outros por equívocos que, muitas vezes, são normais em textos enxutos e didáticos, e são muito mais cruéis com lives e youtubers. Eu entendo que ciência é uma coisa e vulgarização do conhecimento é outra, mas, enfim, temos que tentar encontrar esses espaços e começar a trazer algumas reflexões, sem termos medo de nos "sujar" fora da acasdemia.

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  23. Agradeço aos autores pelo esforço de esclarecimento em torno dos abusos promovidos pela direita brasileira no que tange os temas da história medieval, mas gostaria de alertar para seis pontos que creio ser bastante problemáticos no texto apresentado:
    1 - Quando escrevem: “Os historiadores contemporâneos preferem utilizar o conceito de Dominação Senhorial em detrimento de Feudalismo.” apresentam um equívoco evidente. O que ocorre não é uma preferência de um termo por outro, mas a aplicação precisa dos termos e conceitos. Se até a segunda metade do século XX o termo "feudalismo" era empregado como conceito guarda-chuva para definir todos os tipos de relações de domínio político, econômico e social, hoje se aplicam termos mais precisos, como o de domínio senhorial, quando este é o caso, mas também de feudalismo/domínio feudal quando este se apresenta. A precisa crítica de Alain Guerreau sobre o conceito de feudalismo no início dos anos 1980 não aboliu o conceito, mas promoveu novas reflexões sobre o mesmo, que levaram a uma maior precisão de sua aplicação.
    2 - “Mas, se o Feudalismo não existiu, como explicamos o Encastelamento?”. De fato, seria complexo demais pensar o encastelamento NA FRANÇA sem o feudalismo ou o senhorialismo. Se, por outro lado, o encastelamento é visto como um processo amplo, que atinge toda a Europa ocidental, então é preciso justificá-lo com base em outros argumentos, que considerem processos históricos distintos. O encastelamento no norte da península itálica e nas ilhas britânicas são respostas a fenômenos distintos, e precisam ser compreendidos em sua especificidade.
    3 - “Podemos dizer, então, que entre os séculos VIII a IX, a Igreja não só era detentora de terras como também os seus líderes – os bispos – exerciam dominação senhorial, comandando juridicamente diversos territórios e explorando a mão de obra camponesa, através da cobrança do dízimo nas vilas e nas cidades e da cobrança das taxas do comércio.” Tal fenômeno, é preciso destacar, não se restringe ao período apontado. Aqui carece uma maior atenção para o fato dos bispos não exercerem somente funções eclesiásticas, mas TAMBÉM aristocráticas. É dessa dupla função que, inclusive, irá emergir o conflito das investiduras no século XI, pois, uma vez que o bispo recebe ao mesmo tempo funções eclesiásticas e políticas e na carência de uma clara definição das atribuições das diferentes esferas do poder na atribuição de tais funções surge uma crise no tocante aos papéis de papa e imperador no território germânico. Em outras regiões as dinâmicas não se diferenciavam muito e as estratégias da igreja foi distinta em cada caso, mas o objetivo sempre o mesmo: definir sua esfera de atuação na atribuição das funções eclesiásticas.
    4 - “Em primeiro lugar porque não existiram bárbaros. Segundo Dumézil [2016], os grupos étnicos classificados como bárbaros já habitavam o Império Romano antes mesmo de sua dissolução, a exemplo dos Francos.” Aqui os autores entram em conflito com uma vasta historiografia, cujos expoentes são diversos indo desde a escola de Viena, com Walter Pohl e Herwig Wolfram, passando pela escola britânica de Ian Wood e Guy Halsall, e desembocando nas escolas americana e canadense de Patrick Geary e Walter Goffart. Mais uma vez, o fato de haver debates sobre a natureza das sociedades bárbaras é diferente de afirmar que não existiram. Nesse ponto o trabalho de Guy Halsall é fundamental.
    (segue)

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    1. 5 - “Visto isso, falaremos sobre as origens da cavalaria. Barthélemy [2007] defende que o seu surgimento ocorreu no período da “mutação feudal” (século IX), isto é, alguns anos depois do fim do Império Carolíngio. Sustenta também que não houve uma cristianização da cavalaria, pois, os milites já eram cristãos. Porém, o cristianismo criou uma nova forma de se fazer guerras, pois promoveu o encontro entre as práticas monásticas e as guerreiras. Portanto, o autor acredita no surgimento de um novo tipo de cristianismo, oriundo da religiosidade militar. Em outras palavras, houve, na verdade, a militarização do vocabulário cristão, uma prática que, se não for bem estudada, pode gerar leituras equivocada do papel das ordens.” Aqui há o problema mais grave do trabalho, qual seja, a confusão entre a cavalaria, enquanto instituição medieval, em geral associada ao conceito medieval dos bellatores, e as ordens militares ou ordens de cavalaria, que são instituições de caráter monástico surgidas no bojo das ações militares entre a primeira e a segunda cruzada no século XII. Além disso, é preciso pontuar que, se por um lado o máximo expoente do ideal da cavalaria se dá no cavaleiro solitário da literatura de corte dos séculos XII e XIV, a máxima expressão da ordem militar, ou ordem de cavalaria, se mostra nas ordens do templo e teutônica, que, ao contrário do ideal literário, pregam a vida comum, seguindo, aí sim, um modelo orientado pelo monasticismo.
      6 - "Para tanto, dissertaremos sobre as Ordens Militares na Europa medieval, entre os séculos VIII ao XIII." Aqui mais uma vez a confusão entre cavalaria e ordem militar, além de uma temporalidade equivocada. Para as ordens militares a temporalidade deveria iniciar no século XII e para a cavalaria se pode considerar o século X ou XI, na melhor das hipóteses, quando se consolida a figura da cavalaria na Europa ocidental através de funções tais como dos ministeriales.
      A despeito desses ajustes necessários, creio que o texto traz apontamentos interessantes, dentre os quais sobretudo no tocante à face abusiva da extrema direita no seu recurso a temas medievais para aplicação de ideologias políticas modernas. Aqui fica uma sugestão de trabalho comparativo com o papel que o medievalismo desempenhou no nacional-socialismo alemão. Um ponto de partida seria a leitura do artigo e subsequente pesquisa de Andrew Elliot sobre a extrema direita e o medievalismo no "The Public Medievalist".

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    2. Boa tarde,
      Enquanto medievalista, tenho de me associar às questões 5 e 6 levantadas pelo colega Lukas Gabriel. Efetivamente, o texto pareceria confundir cavalaria com ordens militares, dois fenómenos vinculados inclusivamente (as segundas na primeira), mas diferentes na sua essência.
      Obrigado
      Francisco J. D. Marcilla
      PS. Mais comentários em aparte.

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    3. Sabemos que muita coisa pode ter ficado sem a devida explicação. Carecemos de notas, de espaço para debates historiográficos e, inclusive, temos que adaptar a discussão para um público que não é medievalista de carteirinha.

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  24. Boa tarde,
    Acho muito relevante a discussão e debate proposto pelos autores, especialmente por se tratar de um fenómeno global (praticamente em quase todos os países democráticos está a aparecer uma corrente conservadora que utiliza o passado de maneira incorreta e premeditada para justificar o seu ideário).
    Acho que o colega Lukas Gabriel já salientou nos comentários precedentes uma série de pontos que o texto talvez não tenha bem resolvido, nomeadamente os que dizem de alguns conceitos. De facto, a existência de "cavaleiros" é anterior às Ordens Militares, sendo duas realidades diferentes enquanto a cavalaria define um grupo social e um enquadre ideológico que muda no tempo, e as ordens militares definem umas instituições concretas e específicas. Por outro lado, quando o texto assevera que é a Igreja a principal promotora das ordens militares, talvez convinha especificar, já que na Península Ibérica, onde a luta contra o Islão é continuada e sempre presente, são as monarquias as principais promotoras da criação de ordens militares, não a Igreja (embora sempre seja esta quem confirme essa criação).
    Portanto, vou equacionar outros aspetos sem os quais o debate fica, a meu ver, incompleto.
    O "bolsonarismo", o partido "Chega" em Portugal ou "Vox" em Espanha olham para uma Idade Média inexistente. Ou melhor dito, uma Idade Média tergiversada que visa salientar, através de ideias pouco desenvolvidas (melhor falar em "slogans") mas de forte impacto emocional, um programa conservador que pouco tem a ver com a realidade medieval. Converter o pretendido "comunismo" no novo inimigo da fé tem mais a ver com as mentalidades do século XX que com a Idade Média.
    É óbvio que só através da comunicação e a formação dos futuros e presentes votantes conseguir-se-á uma vacina contra o virus do "maniqueísmo" social conservador (a existência sempre de um "inimigo").
    Termino com um comentário de caráter metodológico: talvez teria sido bom, e convido aos autores a penser nisso, a inclusão na definição dos conceitos medievais de "cavalaria", "cristianismo", "encastelamento" e "feudalismo (senhorialismo)" a realidade ibérica, diferente da europeia em vários aspectos.
    Muito obrigado.
    Francisco J. D. Marcilla

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  25. SE O FEUDALISMO NÃO EXISTIU, PORQUE ESTUDAMOS ESTE TEMA? OS VASSALOS, VASSALAGEM, FEUDOS, SENHORES FEUDAIS FORAM EXTINTOS?
    HEIN\ DITMAR NYLAND

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    1. Feudalismo é o mesmo que dizer que o feudo é o modo de produção dominante na Europa, quando não era. Se houve feudalismo, era mais um fenômeno francês. Em outras partes, outros tipos de dominação, que não o feudo, eram comuns. Vassalagem, por sua vez, é o modo que a sociedade se hierarquizava e um vassalo podia receber outros benefícios que não um feudo.

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  26. O AUTOR COLOCA QUE A CAVALARIA PROVAVELMENTE TENHA SIDO CRIADA NO SÉCULO IX. A CAVALARIA E A INFANTARIA NÃO FOI CRIADA PELOS ASSIRIOS POR VOLTA DE 2.000 A.C?

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    1. Cavalaria Medieval. Ela é uma cavalaria MEDIEVAL. Não estamos falando de gente que monta e combate à cavalo. Mas de um grupo específico que surgiu na idade média e, por acaso, lutava à cavalo.

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  27. O AUTOR COLOCA QUE A CAVALARIA PROVAVELMENTE TENHA SIDO CRIADA NO SÉCULO IX. A CAVALARIA E A INFANTARIA NÃO FOI CRIADA PELOS ASSIRIOS POR VOLTA DE 2.000 A.C?
    HEINZ DITMAR NYLAND

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  28. Olá, boa noite !
    Primeiramente, parabenizo ambos autores pelo excelente artigo!
    No cenário político brasileiro atual, estamos vivenciando um populismo mascarado com o retorno do conservadorismo em pauta em toda às esferas do poder e segmentos sociais. Um contexto de incertezas e instabilidades.
    Sendo assim, eu vos pergunto: como a tendência bolsonarista/extrema-direita que preza por uma cultura nacional autoritária e negacionista concilia com o discurso de pós-verdade? Visto que, o mesmo já circula em algumas instituições superiores e na educação básica.
    Desde já, agradeço-lhe antecipadamente !
    Att
    Maykon Albuquerque Lacerda

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    1. O fascismo vive de mentiras. Veja bem, o nacionalismo é uma grande mentira. Sendo assim, em um regime onde a verdade não importa, a mentira reina e os alimenta.

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  29. Olá, autores! Gostaria de parabenizar a todos que foram responsáveis pela criação desse texto.
    Na Idade Média, de acordo com alguns autores, é possível dizer que a igreja tinha um poder gigante sobre a população, e nos dias atuais podemos afirmar que esse mesmo poder foi utilizado para a manipulação dos cidadãos. Podemos comparar essa forma de manipulação utilizada pela na igreja na Idade Média com a manipulação que é efetuada atualmente pela extrema direita em algumas pessoas da sociedade?
    Agradeço pela atenção.
    Moisés Gomes Machado

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  30. Olá, autores!
    Na Idade Média é possível ver a Igreja, que antes tinha tanto poder, perder sua autoridade, pois a sociedade da época estava percebendo que o interesse da mesma se resumia em poder e não em salvar a população de uma perdição espiritual. Contudo, como foi a reação dos camponeses da época ao verem a forma como eram feitas as repartições de terras? Como reagiram quando viram eclesiásticos venderem seus cargos como mercadorias?
    Agradeço-lhes pela atenção.
    Moisés Gomes Machado

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    1. É um erro acreditar que os pobres são sempre sem ação. Os camponeses se revoltaram desde o império romano e continuaram até a Revolução Francesa.

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  31. Géssica Cristiane Ferreira Pinto22 de maio de 2020 às 19:58

    Boa Noite! Parabéns pelo trabalho, gostaria de saber como isso poderia ser adaptado na sala de aula? E se você já fez qual foi a impressão dos alunos e dificuldades encontradas.

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  32. Excelente texto! Muito necessário neste período de tanto negacionismo histórico e de manipulação de conflitos.
    Estudo História e uma das partes que mais me interessa é o período Medieval e Antigo, mais especificamente sobre as sociedades denominadas de Barbaras, como os Celtas. Entre essas sociedades vemos que diversos contos foram traduzidos para o latim e foram cristianizados, como a lenda de Rei Arthur.
    A dúvida que me surgiu é relativo a questão da cavalaria medieval, mais especificamente como naquele período era recorrente o uso de personagens como salvadores, exemplos de lideres e cristão, como foi utilizada a imagem de Arthur, inicialmente por Nennius (séc. VIII-IX) e Monmouth (séc. XII). Atualmente, nos devidos lugares, Bolsonaro pode ter vencido por causa de uma imagem criada para ser visto como um salvador da patria, um messias enviado por Deus, para salvar nosso País, como diversas personagens medievais cristianizados foram utilizados?
    Friedrich Moraes de Oliveira

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  33. David Jonas Tavares da Costa22 de maio de 2020 às 23:40

    As cruzadas foram muito frequentes durante a Idade Média, a batalha por Jerusalém era muito acirrada, com seus estandartes cristãos, lutavam em nome de Deus, tinham um exército próprio chamado de Templários, que sob juramento, faziam votos de castidade e serviam somente a igreja e o papa por assim dizer. Baseado neste fato histórico, a extrema-direita atualmente não difere muito de alguns deste fatos, como por exemplo: citar a religião. Alguns países de hoje baseiam-se sobre estes tópicos , na questão de serem muito conservadores? Existe alguma influencia nos dias de hoje?

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